Saí do casting e sentei em algum banco daquela praça,
pensei. E depois senti que não devia pensar. Mas logo em seguida pensei
novamente, e entendi que valeria a pena não pensar. Veio-me a mente os poemas
de Alberto Caieiro, e dizia ele que quem pensa não vê com os olhos. Não consigo
ver com os olhos, entendi isso. E depois de tudo isso relembrei o que vim fazer
aqui. Vim tentar fazer o que eu achava que veria com o coração, porém aqueles
que me viam, o faziam com os olhos e não com o coração, ou talvez esse seja
apenas meu ponto de vista. Eu aqui, com 25 anos, tentando ser o que serei daqui
há 20, 30, quiçá 40 anos. Sinto-me irritado com o ar, com as pessoas que falam
ao meu redor. Após alguns instantes me levanto e dirijo-me ao bar mais próximo.
Chegando ao bar peço uma cachaça que faça aliviar o embrulho de meu estomago.
Olho ao redor e procuro alguém com quem falar. Eu queria falar. Queria alguém a
quem falar. Sinto-me sozinho. Sozinho é a palavra que me defini em todos esses
anos. E novamente sinto. Sentir. Lembrei do abraço de minha mãe ao me despedir.
Lembrei da infância. E eu não conseguia me desprender da infância. Porque tudo
antes era tão feliz, tão fácil. Aquele desejo de bolo de chocolate, logo era
preenchido. Eu queria que continuasse
sendo. Queria sentir novamente o cheiro
da terra molhada pela chuva, mas tudo que eu sentia era o gosto amargo da
rejeição. Depois da terceira dose de pinga, resolvi conversar com alguém. O
atendente. O atendente não fazia cara de muitos amigos, mas certamente já teria
pensado o mesmo que eu, afinal aparentava ter quase a mesma idade. Dirigi-me a
ele e perguntei quais eram os planos, ele me respondeu que era servir aquelas
outras mesas. Mas quais planos seriam esses? Porque tão breves? Nada a longo
prazo? Novamente pus-me a pensar sobre Alberto Caiero, e certamente ele não
faria planos para o amanhã. Pois eu faço. Fico a imaginar como seria o hoje, se
eu não tivesse caminhado até esse bar e pedido essa cachaça. Imagino também
como seria se não tivesse saído de lá. Talvez teria uma vida longa e feliz no
campo. Ou talvez ainda uma vida cheia de tédio e insatisfações. Mas, espere,
tédio é algo que tenho alimentado ao passar de todos esses anos aqui na cidade.
Será possível sentir tédio em lugar cheio de atrativos? Sim; respondo com
certeza. Estou aqui e sozinho. Tanta
gente ao redor e ninguém. Já estou agora bêbado, e cansado o bastante para
poder parar de pensar. Mas como poderia parar de pensar? Há tantas coisas que
me vêem a cabeça. E elas não param de vir. Coisas que vieram e que virão. Será
que sou um ator? Como saberei se sou um ator se nem mesmo sei quem sou eu. Eu
mesmo, eu Hélio, aquele que nasceu em 1986 naquela cidade do interior, e que
depois veio até São Paulo tentar ser... alguém. Alguém? Como se pode ser alguém
quando não se pode nem se quer saber quem é. Quem é alguém? Nem se quer sei o
que essa palavra significa. Consultando meu dicionário de bolso – sim, tenho um
dicionário de bolso – vejo que significa “pessoa não identificada.” Pessoa não
identificada? Pois agora acho que mudei de idéia. Talvez eu seja uma pessoa não
identificada.
P.R
Nenhum comentário:
Postar um comentário